Mil Sóis Resplandecentes, Khaled Hossini (Editorial Presença)
Mil Sóis Resplandecentes é um livro
que relata a vida de duas mulheres afegãs, Mariam e Laila, que, pelos malogros
da vida se veem ambas casadas com um homem absolutamente primitivo.
Mariam é filha ilegítima
de um homem abastado, dono de um cinema em Herat, casado com três mulheres, e
da sua antiga criada. Cresce na ânsia de agradar o pai, que idolatra, ignorando
os queixumes constantes da mãe que tenta envenenar a relação da filha e do pai,
dizendo que ele não passa de um mentiroso que no fundo não quer saber dela. "Sabes
o que ele disse às esposas, à laia de defesa? Que eu é que o seduzi. Que a culpa era minha. Didi?
Percebes? É isto que significa ser mulher neste mundo. (...) Aprende já isto e
aprende bem, minha filha: assim como a agulha de uma bússola aponta para o
norte, também o dedo acusador de um homem encontra sempre uma mulher. Sempre.
Recorda-te disso, Mariam."
Ignorando os avisos da mãe de
que morreria se ela a abandonasse, quando faz quinze anos desloca-se sozinha à
cidade para visitar o pai - que não a recebe, deixando-a mesmo passar a noite
no chão, à porta da sua casa. Quando, expulsa de manhã, regressa ao casebre
pobre onde vive, descobre a mãe morta. Vai então viver com o pai, durante um
período muito curto, até as mulheres dele arranjarem um marido para ela, em
Cabul, que a obrigam a aceitar.
Laila nasce numa das
casas vizinhas de Mariam e do marido, Rashid, quando Mariam tem 19 anos - casada
há 4. Tem uma infância relativamente feliz, ao lado do seu melhor amigo Tariq,
durante o domínio soviético do Afeganistão. O pai é extremamente presente, mas
a mãe é uma mulher deprimida por ter deixado ir - e, mais tarde, perder - os
seus dois filhos mais velhos para a guerra. O pai de Laila não descura de todo
a sua educação: "O casamento pode esperar, a educação não. Tu és uma
rapariga muito, muito inteligente. Falo a sério. Podes vir a ser aquilo que
quiseres, Laila. É algo que eu sei. E sei também que quando esta guerra acabar,
o Afeganistão vai precisar tanto de vocês como dos seus homens, talvez ainda
mai. Porque uma sociedade não tem hipótese nenhuma de progredir se as suas
mulheres forem ignorantes, Laila. Hipótese nenhuma." Quando a sua casa
é bombardeada, nos confrontos após a derrota dos comunistas, e os pais são
mortos, Laila é recolhida por Rashid, que acaba por convencê-la a casar-se com
ele.
As duas mulheres passam a
apoiar-se incondicionalmente, presas a um casamento infeliz com um homem que as
maltrata, e prisioneiras da sua própria condição de mulheres durante o regime
talibã que as impede de sequer saírem de casa sem a presença de homem.
Conta
atrocidades escabrosas e revoltantes e, no entanto, é um livro lindíssimo, que nos
toca profundamente - comoveu-me, indignou-me e mexeu bem lá no fundo - e
que não deve deixar de ser lido.
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