A História do Amor, Nicole Krauss (Publicações Dom Quixote)

    Andava eu a "vaguear" pelo "Goodreads" quando me deparei com este livro. Como é meu hábito, li o resumo, que me interessou bastante: Leo Gursky comunica com o vizinho para irem sabendo se o outro está vivo; mas há sessenta anos, apaixonara-se e escrevera um único livro, que julga perdido - "A história do amor". Mas não só o livro não se perdeu, como atravessou o mundo e gerações, servindo inclusivamente de inspiração para o nome de uma rapariga americana - Alma.
    Julguei lembrar-me de já ter visto o livro lá por casa, e até durante bastante tempo na estante giratória da sala. Encontrei-o uns tempos mais tarde, no sótão e, quando li o resumo, reconheci a história que me tinha interessado e comecei a lê-lo.
    Enquanto Leo se vai interrogando sobre como será a sua morte, e vai procurando gerir a dor da morte do filho que nunca soube da sua existência ("talvez seja esse o significado de ser pai - ensinarmos os nossos filhos a viver sem nós. A ser assim, ninguém terá sido melhor pai que eu."), Alma lida com as suas próprias descobertas e questões de rapariga de 14 anos ("Porque é que as pessoas são sempre batizadas com nomes de pessoas mortas? Já que têm de ser nomeadas a partir de qualquer coisa, por que não a partir de coisas mais perenes, como o céu, ou o mar, ou mesmo ideias, que nunca morrem, nem mesmo as más?"), enquanto tenta ajudar o irmão mais novo a integrar-se ("Tens de tentar ser normal!") e procura trazer a mãe de volta à vida e ao amor:

    "18. A MINHA MÃE NUNCA SE DESAPAIXONOU DO MEU PAI
Manteve o seu amor por ele tão vivo como no verão em que se conheceram pela primeira vez. Para o conseguir, virou as costas à vida. às vezes subsiste durante dias a água e oxigénio. Sendo a única forma de vida complexa conhecida a fazê-lo, o seu nome devia ter designado uma nova espécie. (...)
   A minha mãe (...) escolheu o meu pai, e para preservar um certo sentimento, decidiu sacrificar o mundo."

  Entretanto vamos sabendo o que aconteceu ao livro, e o motivo pelo qual ele surgiu: Alma Mereminski, o amor de juventude de Leo Gursky. Não posso deixar de partilhar a passagem seguinte, a mais bonita do livro (em me entender):

    "Se eu tivesse uma máquina", disse eu, " todos os dias te tirava uma fotografia. Assim havia de lembrar-me como tu és todos os dias da tua vida." "Sou sempre igual." "Não és não. Estás sempre a mudar. Todos os dias um bocadinho. Se eu pudesse, guardava um registo de tudo." "Já que és assim tão esperto, diz-me lá em que é que eu mudei hoje?" "Para já, estás uma fração de milímetro mais alta. O teu cabelo está uma fração de milímetro mais comprido. E os teus seios estão uma fração de..." "Não estão nada!" "Isso é que estão." "NÃO estão." "Estão, estão." "E que mais, seu grandessíssimo ordinário?" "Estás um bocadinho mais feliz e um bocadinho mais triste." "Quer dizer que se anulam mutuamente, deixando-me exatamente na mesma." "Nem por sombras. O facto de estares um bocadinho mais feliz hoje não altera o facto de também estares um bocadinho mais triste. Todos os dias te tornas um bocadinho mais triste e feliz, o que significa que agora, neste preciso momento, estás mais triste e mais feliz do que alguma vez estiveste em toda a tua vida." "Como é que tu sabes?" "Pensa lá bem. Alguma vez te sentiste tão feliz como agora, deitada aqui na relva? " Acho que não. Não." "E alguma vez te sentiste mais triste?" "Não." "Nem toda a gente é assim, sabes. Algumas pessoas, como a tua irmã, tornam-se apenas mais felizes de dia para dia. Outras, como Beyla Asch, ficam só mais tristes. E outras, como tu, ficam ambas as coisas." "Então e tu? Também estás mais feliz e mais triste do que nunca?" "Claro que sim." "Porquê?" "Porque nada me faz mais feliz nem mais triste do que tu."

    O livro está escrito de forma maravilhosa e, infelizmente, esta entrada já está demasiado grande para partilhar mais passagens. Confesso que fiquei um pouco desiludida com o final, que me pareceu demasiado abrupto - contava com mais, mais explicações, mais descobertas. Senti como se a autora tivesse subitamente ficado farta de escrever. De qualquer forma, o livro valeu pelos momentos em que sustive a respiração com a beleza de algum trecho, que me fazia fechá-lo por uns momentos, para absorver tudo o que tinha acabado de ler, antes de me permitir continuar.

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