A ridícula ideia de não voltar a ver-te, Rosa Montero (Porto Editora)


 
  Comecei a ler este livro que estava na pilha dos livros por ler, em cima de um pequeno baú no meu quarto, para ver se poderia ajudar um amigo a passar por um período muito difícil da sua vida. Mas este não é um livro sobre a morte, como a autora nos diz, embora e inevitavelmente reflicta sobre a morte, em especial a morte da pessoa com quem partilhamos a vida. A ridícula ideia de não voltar a ver-te resultou da proposta da editora para que Rosa escrevesse um prólogo para a edição do diário que Marie Curie escreveu quando perdeu o marido, Pierre.
     Rosa tinha passado pelo mesmo e não queria continuar a escrever o livro que tinha entre mãos, não se tratava de um bloqueio mas de falta de sintonia, como ela reconhece. Mas, como diz logo no início, A verdadeira dor é indizível. Se conseguimos falar do que nos angustia estamos com sorte: significa que não é assim tão importante. Porque quando a dor cai sobre nós sem paliativo, a primeira coisa que nos arranca é a #Palavra.
     E por isso a autora usa a vida de Marie Curie e vai entre cruzando as palavras do diário de Marie com pequenas histórias e pensamentos. E entre essa histórias, enredos, personagens fala sobre a situação da mulher, agora e no início do século XX e, muito especialmente, sobre a situação das mulheres cientistas, de filhos, da família, de estereótipos . E o tom coloquial faz-nos crer que se trata de um conversa. A autora fala com o leitor - ou será que fala com Pablo? - e a leveza com que vai articulando os diversos temas a propósito do diário de Marie faz-nos imaginar um diálogo, deixas que podíamos aproveitar para contar as nossas histórias. E é, de alguma forma, pelas histórias que narra, pela divagação entre o diário e as memórias de Marie e dela própria, um livro muito feminino
    Mas é inegavelmente um livro para exorcizar a dor da perda: Narro e partilho uma noite lacerante e, ao fazê-lo arranco centelhas de luz ao negrume. (...) Esmagamos carvões com as mãos nuas e às vezes conseguimos que pareçam diamantes. E os leitores vislumbram esse brilho entre a dor da perda que é duplamente narrada.


    Uma palavra final para a belíssima capa - design de Manuel Pessoa sobre imagens de Philippe Halsman - e para a edição extremamente cuidada.

Comentários

Os mais lidos

O Sétimo Juramento, Paulina Chiziane (Sociedade Editorial Ndjira)

Niketche, Paulina Chiziane (Caminho)

Os Bem-Aventurados, Luísa Beltrão (Editorial Presença)