Pais e Filhos, Ivan Turguéniev (Relógio D'Água)
Começar por dizer que gostei muito de ler este livro pode dizer pouco, mas continuo a pensar que os livros se dividem entre os que gostamos de ler e os que não gostamos de ler. Como ouvi dizer recentemente, ler um livro é como falar com um amigo e há livros com quem gostamos mais de falar. Neste caso, confesso até que terei alguma dificuldade em explicar porquê, mas o que é certo é que mesmo não vivendo de episódios nem procurando criar suspense, não me apetecia parar de o ler.
Provavelmente, na sua essência, e como o título indica, é um livro sobre pais e filhos, sobre gerações, sobre a forma como convivem, se cruzam, chocam e, por fim, na maior parte dos casos, se entendem. Mas é também um livro sobre o amor, ou sobre a importância do amor correspondido. E, não menos importante, é um livro que tem como cenário a Rússia aristocrática e rural, no final do século XIX.
Pais e Filhos começa com a chegada de Arkadi, jovem estudante, que aparece acompanhado de um amigo, Eugéni Bázarov. O pai, Nikolai, viúvo, vive com o irmão Pável. São estas duas personagens, Bázarov e Pável, aparentemente secundárias e opostas, que ao longo do livro vão atrair a nossa atenção.
Pável, descrito como solteirão e solitário, «entrava naquele tempo incerto, crepuscular, em que as nostalgias se parecem com esperanças e as esperanças com nostalgias, em que a juventude já passou e a velhice ainda não chegou».
Bazárov é, nas palavras de Arkadi, um niilista, ou seja, é «um homem que não se curva perante nenhuma autoridade, que não tem fé em nenhum princípio, seja qual for o respeito que rodeia esse princípio».
Os dois desdenham-se, confrontam-se e opõem-se:
«Dantes os jovens tinham de estudar; não queriam passar por ignorantes e por isso trabalhavam mesmo contrariados. Mas agora basta-lhes dizer: tudo no mundo é absurdo! - e está o assunto arrumado. Os jovens ficam encantados. E na verdade, outrora eram uns papalvos, mas agora tornaram-se de súbito niilistas.»
A história decorre entre a casa da família de Arkádi, dos pais de Bázarov e ainda a casa de Anna Serguéievna Odíntsova e, no final, o autor esclarece o leitor sobre o «que faz agora, precisamente agora, cada uma das nossas personagens».
O livro tem passagens excelentes que não hesitei em roubar:
«O tempo (toda a gente sabe) voa por vezes como um pássaro, outras vezes arrasta-se como uma lagarta; mas o homem sente-se especialmente bem quando nem nota se o tempo passa depressa ou devagar.
(...)
O aparecimento da vulgaridade costuma ser útil muitas vezes na vida: ela alivia as cordas demasiado tensas, atenua os sentimentos de presunção ou de falta de respeito próprio, lembrando-lhes o seu parentesco com eles.»
Uma palavra final para a tradução - de António Pescada - e para a edição, que me pareceram exemplares (confesso apenas que não gosto que as notas estejam no final do livro, em vez de aparecerem no rodapé da página em que são referidas).
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