O Último Amante, Teresa Veiga (Tinta da China)

    Mesmo antes de iniciar este blogue - já faz mais de 10 anos - que tenho o hábito de, mal acabo de ler um livro, tomar algumas notas, escrever as minhas impressões e roubar as frases que sublinhei à medida que o fui lendo. Tornou-se um hábito de forma que, em regra, não consigo começar a ler novo livro antes de o fazer, como se precisasse de resguardar a memória do que li e evitar que um e outro se cruzem e se baralhem personagens e enredos.
    Mas nestes últimos dias tenho encadeado leituras umas nas outras, sem parar para escrever sobre cada livro que li, e de repente dei conta que ao lado dos livros para ler se têm acumulado os lidos mas não guardados, porque aguardam que me despeça como merecem, escrevendo as recordações que deles guardei.
   Já li há algum tempo O Último Amante, que me foi oferecido por um amigo. Confesso que nunca tinha ouvido falar neste livro, nem sequer da Autora, Teresa Veiga. A nota biográfica que encontrei em vários sites surpreendeu-me, dado que, para além de fornecer alguns dados a que junta umas fotografias do seu rosto, referem o seguinte: «Da autora Teresa Veiga pouco se sabe, uma vez que não dá entrevistas nem revela a sua verdadeira identidade. Nasceu em Lisboa, em 1945...»
    Mas não é a Elena Ferrante portuguesa. Como refere Isabel Lucas, «Teresa Veiga é o nome de alguém que quer falar exclusivamente através da sua obra» (Ipsilon, 12 de outubro de 2020) e se assim é, depois de ler O Último Amante, sei que quero continuar a ouvi-la falar.
     O Último Amante reúne quatro contos - ou serão novelas? confesso a minha dificuldade em lidar com estas classificações - e tendo gostado de todos, gostei particularmente do primeiro, A minha vida com Bela. Bela é a Florbela Espanca por quem a narradora nutre uma profunda admiração e a quem decide escrever uma carta. Combinam encontrar-se e ela convida Bela a passar uns dias no Algarve numa casa que tinha acabado de comprar. Ali passam uns tempos, entre setembro e novembro, passeando, escrevendo e lendo, numa relação quase servil da narradora relativamente a Florbela. Apesar de saber que se trata de uma história ficcionada, não consegui deixar de me interrogar se haveria alguma verdade naqueles dias passados em conjunto pelas duas. 
     O segundo conto, que dá o nome ao livro, O Último Amante, passa-se em Lisboa. Escrito, como o anterior, na primeira pessoa do singular, é narrado por uma jovem que vive com a família numa casa que fica defronte de uma casa apalaçada onde mora um jovem marquês, que se encontra muito doente e que se sente atraído por ela. Mas sem que se aperceba, o padrasto do jovem também se sente atraído por ela, o que espoleta uma grave crise familiar.
    O terceiro conto, Antes da revolução, conta a história da chegada a Portugal, para uma curta estadia, de Antoine, sobrinho da mãe da narradora e que é apresentado como sendo um importante cineasta. O sobrinho trabalhou como assistente de realização e realizou apenas uma curtíssima metragem, mas aceita as deferências com que é recebido e apresentado.
    No último conto, Canção do lagarto negro, o narrador é um homem que vive com Felícia, que à noite espreita os movimentos de uma casa que fica em frente. Naqueloutra casa vive Raquel, com quem ele mantém uma relação clandestina que é interrompida quando ela recebe em casa um familiar gravemente doente.
    Mas resumir estes contos é dizer muito pouco sobre eles. Se por um lado não quero estragar o prazer de quem os ler descobrir as histórias que Teresa Veiga nos conta e os respetivos desfechos, em todos há pequenas histórias que correm paralelas, conflitos internos e familiares, descobertas pessoais e até personagens que passam de um para outro conto.
    A edição é muito bonita. Fiquei curiosa quanto à pequena fotografia a preto e branco, com três mulheres, que aparece na página 5 e que não é referida em lado nenhum, nem tem legenda.

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