Um passado perfeito, Leonardo Padura (Edições ASA)
Primeiro livro deste autor cubano que leio e seguramente não será o último. Um policial, muito bem construído e escrito. Mario Conde, o detective, investiga o desaparecimento de um alto quadro cubano que tinha conhecido na juventude e que tinha conquistado e casado com Tamara, por quem o detective tinha desde esses tempos uma paixão.
Um universo distinto daquele que povoa os policiais americanos e europeus (recentemente os nórdicos) que tenho lido, a começar pelo crime investigado, um crime económico. Lateralmente há referências a um caso de violação de uma menor e ao assassínio de uma criança por jovens. Mas não há litros de sangue, nem mortes brutais pormenorizadamente descritas neste livro. Por outro lado, há referências a reuniões com sessões de autocrítica e uma consciência social que percorre o livro e a que não é indiferente o crime que é investigado - A que carga d'água alguém pode brincar com o que é meu e é teu e é daquele velho que está a vender jornais e daquela mulher que vai atravessar a rua e que se calhar morre de velhice sem saber o que é ter um carro, uma casa bonita, passear por Barcelona ou pôr um perfume de cem dólares e que, se calhar, se vai meter agora mesmo numa fila para comprar batatas, Conde. A que carga d'água?
A vida privada de Mario Conde, depois de dois casamentos falhados, é repartida entre a sua casa, que partilha apenas com um peixe, e a casa do seu amigo Magricela, paraplégico, e da sua mãe que cozinha deliciosas e laboriosas refeições para ambos. Mas mesmo esta ligação é ensombrada pelo receio de vir a perder os dois em breve, por doença da mãe e agravamento do estado do Magricela.
Roubei algumas frases, o que é pouco habitual num livro policial:
Era uma boa tarde para estar vivo e ser feliz com ou sem guitarra (...) pensou que muitas vezes ele também fora feliz e que um dia o seria novamente e que a solidão não é um mal incurável....
Mas a vida mudou, como tudo muda, e já não era nem irresponsável nem louco, só tão complicado como sempre e sem remédio, e triste e solitário e sentimental, sem mulher nem filhos talvez para sempre, sabendo que o seu melhor amigo podia morrer e não havia nada a fazer....
Já nem connosco nos parecemos, porque nós, os de outrora, nunca mais voltaremos a ser os mesmos.....
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