De quanta terra precisa o homem e outros contos, Lev Tolstói (Relógio d'Água)

    Como sempre, parto para férias com a convicção que vou ter muito tempo para ler e, por isso, carregada de livros, muitos dos quais regressam a casa por ler. 
    Comecei a leitura de férias deste ano com este livro De quanta terra precisa o homem e outros contos e o tempo que levei a concluí-lo não resultou apenas da falta de tempo para o ler mas também da falta de vontade de pegar nele e continuar a leitura. Com exceção do primeiro conto, Polikuchka, os restantes são contos que Lev Tostói escreveu nos anos oitenta do século XIX e a grande maioria já no século XX, poucos anos antes da sua morte. 
    Do que conheço da vida do autor, reforçado pela nota da badana, extraída de Aulas de literatura russa de Vladimir Nabukov, estes contos correspondem à segunda parte da sua vida:
    Em finais de setenta, já passado dos quarenta anos, a sua consciência triunfou: o ético ultrapassou o estético e o pessoal, e levou-o a sacrificar a felicidade da mulher, a pacífica vida familiar e a sublime carreira literária, em nome daquilo que considerava uma necessidade moral: viver de acordo com os princípios da moralidade racional cristã - a simples e austera vida da humanidade em geral, em vez da empolgante aventura da arte individual.
    Esta atitude é evidente nos vários contos, designadamente no conto O Medidor-de-linho, História de um cavalo, em que à semelhança de Xerazade, o cavalo (Medidor-de-linho) todas as noites conta aos restantes cavalos a história da sua vida e vai refletindo sobre os homens e as regras pelas quais se rege a vida em sociedade, em especial sobre o direito de propriedade:
    (Os homens) Combinam entre eles que só um pode dizer de uma coisa determinada:"é minha". E aquele que, de acordo com este jogo convencional, diz "é minha" sobre o maior número de coisas passa, entre eles, por ser o mais feliz. Porque é assim, não sei, mas é assim mesmo.
    E se os contos têm todos uma moral, o que dá o nome ao livro é exemplar ao terminar com Pakhom, o protagonista, a morrer de exaustão, quando tenta abarcar o máximo de terra que consegue porque assim será sua  - Faz um círculo do tamanho que te apetecer, mas volta antes do pôr do sol ao sítio donde partiste. Tudo o que percorreres será teu. 
    Uma palavra para a tradução, de Nina Guerra e Filipe Guerra, que me pareceu exemplar, bem como para a edição em termos globais.

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