A missão, Ferreira de Castro (Livros de Bolso Europa-América)

    A semana passada fui à feira do livro da Snob na Cossoul, antes daquela mudar para as novas instalações e, entre os muitos livros que estavam à venda, encontrei, numa pilha de Livros de Bolso Europa-América, "A missão". De Ferreira de Castro só li - e há muitos anos - Emigrantes. Tinha vontade de ler outros livros dele e por isso comprei este que comecei a ler imediatamente. 
    É o quinto livro desta coleção, foi editado em 1971 e este exemplar teve pelo menos um dono anterior que o carimbou (nome e morada) na primeira e na última página (o que terá levado a que se deixasse de carimbar o nome ou o ex libris nos livros?)
    A missão é uma novela passada numa pequena aldeia francesa durante a II Guerra Mundial e narra o dilema vivido pelo Superior que não sabe se deverá determinar a pintura da palavra Missão no telhado evitando desta forma a confusão com uma fábrica próxima e o possível bombardeamento pelos aviões alemães. Contudo, se a Missão for assinalada, provavelmente a fábrica e os operários serão bombardeados. Ligado a este dilema estão dúvidas sobre a fé e também sobre o valor das pessoas: 
    "(...) Ora, eu não estou convencido de que, pelo fato de ser um profissional da Fé, seja efetivamente melhor do que todos esses quatrocentos homens que trabalham na fábrica e cujas qualidades desconhecemos."
    Mas ao mesmo tempo que vivemos o dilema, expectantes relativamente à decisão que será adoptada, deliciamo-nos com as descrições das personagens e do ambiente envolvente, incluindo da guerra:
     "(...) Ele pressentia que a própria gordura do seu corpo baixo e arredondado, a sua cara larga e aquelas pálpebras entumescidas sobre os olhos luzidios o tornavam mais atraente às crianças. E, pela primeira vez, não lhe despraziam os excessos que a natureza lhe dera, como se houvesse colado sobre ele, camada a camada, o que economizara nos corpos de outros missionários."
    "(...) Deixara de ser o quente rumorejo de insetos e adquirira a regularidade e a frieza dos ruídos mecânicos. (...) O Superior não se moveu. Admitiu que chegara o castigo de Deus e que ele merecia, talvez esse castigo. Michaux e os outros missionários caminharam até à cerca e puseram-se a olhar o céu. Era uma limpidez azul de Junho, sem outra mácula além daquela: além daqueles três pequenos pontos que iam engordando de instante a instante e formando uma linha de reticências no espaço sidério, um espaço tão vazio de perdão como de vingança."
   A Missão só peca pela dimensão.Quando viramos a última página só nos apetece continuar a leitura.

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