O cuco, Camilla Lackberg (Porto Editora)

O cuco
   Ofereceram-me este livro. Não há nada melhor que uma prenda inesperada. Por isso e pelas saudades que tinha de ler um policial, não resisti a começar a lê-lo de imediato.
    Confesso que ficou muito aquém - não direi da minha expetativa - mas do que considero um bom policial, como os os escritos pela Ruth Rendell, que nos prendem logo nas primeiras palavras.
  Já passaram praticamente 10 anos (tantos?) desde que li os primeiros livros da Camilla Lackberg. O que escrevi sobre A Sombra da Sereia aplica-se ao que senti quando li este último livro:

   «O efeito surpresa não existiu desta feita. A narrativa é muito simétrica à do outro livro: um crime acontece na tranquila vila de Fjallbacka, Patrik Hedstrom, inspetor, conduz a investigação e a mulher, a escritora Erica Falk, vai investigando por sua iniciativa e acrescentando peças ao puzzle. A narrativa desdobra-se em dois momentos distintos (...)»

   Também neste romance policial acontece o mesmo: os crimes ocorridos no presente estão ligados - descobrirá a Camilla - ao homicídio, nos anos 80, de uma mulher trans e do que se crê ser a sua filha. Enquanto acompanhamos a vida quotidiana da sua família, marcada pelo afeto entre todos, em particular entre Erica e Patrik, somos confrontados com a violência das mortes e também da indiferença com que os crimes são perpetrados e, nalguns casos, sentidos.
    Quando acabei de ler O cuco interroguei-me sobre o título escolhido, mas penso que é uma referência à vertente parasita deste pássaro, dado que é uma situação similar que espoleta a sequência de homicídios. Há nesta história o aproveitamento de um tema da atualidade, ao abordar a morte não investigada de uma mulher trans, que a autora apresenta como uma forma de lhe fazer justiça, mas parece-me pouco credível que mortes ocorridas nos anos 80, apesar das circunstâncias, se sobreponham ao horror do homicídio de duas crianças na atualidade.
    Lembrei-me da frase de Nietzsche «Beware that, when fighting monsters, you yourself do not become a monster», na versão de Bono em Miss Sarajevo:

    The prayer is that we don’t become a monster
    In order to defeat a monster
   That’s our prayer tonight

   (A prece é que não nos tornemos um monstro
    Para derrotar um monstro
    É essa a nossa prece esta noite)

  Mas n'O cuco há alguma complacência ou aceitação para com o monstro - mais corretamente, os monstros - e pouca reflexão.

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