A Breve Vida das Flores, Valérie Perrin (Editorial Presença)

 A Breve Vida das Flores    Não sei porque associo férias a leituras mais ligeiras quando deveria ser exatamente o oposto. Mais tempo livre deveria permitir-me ler livros que a corrida do dia a dia quase sempre impede. Mas, em regra, estendo a preguiça dos dias de férias aos livros que leio, exceção feita aos livros cuja ação decorre no local para onde vou passear. 

    Nestas férias, quando embarquei para Cuba, não levava muitos livros porque para além de não ter espaço na bagagem, não pensava ter muito tempo para ler. Como tinha acabado de ler o último livro de Leonardo Padura, Como Poeira ao Vento, passado justamente em Havana, levei comigo «A Breve Vida das Flores», de Valérie Perrin, que me emprestaram.

    Já tinha ouvido falar dele e tinha alguma curiosidade. Como é referido na contracapa, a protagonista, Violette Toussaint, é guarda de um cemitério, numa pequena vila e divide a vida entre a venda das flores, a anotação cuidadosa dos diferentes funerais e discursos fúnebres, o cuidado com os túmulos e as plantas do cemitério e a conversa com os coveiros, agentes funerários e um padre.

    Até que - como era expectável - aparece um homem no cemitério que quer perceber porque é que a sua mãe pediu para as cinzas serem deixadas na campa de um homem que ele desconhecia. Conhecer a história desta mulher - através da leitura do seu diário – leva Violette a também tentar compreender o que aconteceu com a sua vida e as perdas que sofreu. E não é difícil imaginar como acaba.

   Não sabia (não sei) se existem guardas de cemitério, cuja função seja manter o cemitério seguro e conservar os túmulos, porque pensei que essa função seria dos coveiros. Mesmo nos agradecimentos, a Autora fala no coveiro e no agente funerário e não menciona nenhum/a guarda de cemitério. Se existe ou existiu tenho dificuldade em imaginar como uma profissão que, quer no caso de Violette, quer no caso do seu antecessor, era exercida por pessoas que tinham tido perdas dramáticas nas suas vidas.

    Surpreendeu-me (e irritou-me um pouco até, confesso) a referência recorrente a ofertas de bonecas com trajes típicos portugueses, trazidos anualmente por uma portuguesa. As bonecas são sempre descritas como «horrorosas», com olhos que abrem e fecham e que Violette tenta esconder a todo o tempo.

    Quer no caso da Violette, quer no caso da mulher que queria as cinzas espalhadas no túmulo de um desconhecido do filho, as cores assumem um papel determinante nas respetivas vidas, tornando-as simétricas. A primeira usa roupa colorida sob robes ou casacos sem cores, a segunda passa a usar cores quando se apaixona. No caso de Violette, a descrição das cores na casa chega a lembrar a casa da Barbie: «Viu o quarto pintado de novo, o tapete azul celeste, uma colcha rosa-pálido, um verde-amêndoa nos cortinados e nas cortinas. Um creme para as mãos sobre a mesa de cabeceira branca.»

    A Breve Vida das Flores passa-se em épocas distintas, com personagens diferentes como se fosse um puzzle cujas peças fossemos encaixando até vermos a imagem completa. E nesse aspeto está conseguido, cruzando as diversas vidas e histórias das diferentes personagens.  

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