A balada da praia dos cães, José Cardoso Pires (o jornal)


José Cardoso Pires @ Clube de Leituras   Crescer tem destas coisas. Foi livro que pus de lado há muitos anos, por então ter uma maturidade literária mais para o verdusco. O autor inova demais, pensei na época. Out of my league.
    Cresci e dei-lhe outra oportunidade. Adorei o desafio de o ler como se tivesse de o decifrar enquanto romance. É um relatório? É um relato? Aconteceu? Não aconteceu? É um daqueles livros que emprega a repimpada arte do fluxo de consciência?
    Pus de parte a ideia de lhe compreender a trama (que é vício de quem leu tudo o que a Dama do Crime escreveu). Resolvi-me a seguir os passos do personagem principal, o chefe de Brigada Elias Santana (que foi sempre o Raul Solnado na minha imaginação), atribuir-lhe uns trejeitozitos de Poirot à alentejana e deleitar-me com as mudanças de humor do narrador (que é também a imaginação febril de Elias). Embora a autoria da investigação pertença à PJ, não podemos esquecer que o crime se dá em 1960, tem contornos políticos, a Pide paira, mas não chega a pôr o pé no cenário (ainda bem, ou não). É um romance policial que interessa mais pela inovação no seu estilo narrativo (ou estilos), do que pela intriga em si. Sabemos desde o princípio quem morre, quem poderá ser o executor. O resto, o recheio é reconstituição, é viagem, é paisagem, é a boazona da Mena na cadeia, é o Solnado a fazer festas ao lagarto. Em suma, é uma aula de escrita de romance. Tente quem quiser inovar, pode ser que o consiga, como o mestre JCP.

Catarina Durão Machado


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