O ministério da felicidade suprema, Arundhati Roy (Asa)

Penso que senti este mesmo tipo de fascínio com alguns livros e personagens de Gabriel Garcia Marquez, mas não ousaria falar em realismo mágico neste caso, porque a realidade das pessoas aqui retratadas é na maioria dos casos dilacerante. Se houver magia é nas personagens, na forma como se relacionam, protegem e sobrevivem. Como disse a autora, este livro «é sobre aqueles que foram postos fora do sistema (...) excluídos. E
que conseguiram juntar-se, como peças perdidas de um puzzle, num certo
lugar de relativa felicidade. Há felicidade nos lugares mais estranhos e
inesperados. E, por mais frágil que seja, tem a sua integridade». (Entrevistada por Luciana Leiderfarb, a propósito da publicação desta obra, Expresso a 13.08.2017)
Ao longo da leitura percebi o grande desconhecimento que tenho relativamente à Índia ou ao subcontinente indiano, como se lhe referiu Arundhati. E com este livro mergulhamos de repente, sem esperar e sem aviso, nos conflitos entre indianos, paquistaneses e caxemirenses, agravados por nacionalismos diversos e castas, numa intrincada rede que temos dificuldade em seguir e situar-nos. A dificuldade é ainda aumentada pela utilização de palavras ou expressões não traduzidas ou referências não explicadas ou contextualizadas pelo editor ou tradutor.
O livro é de uma violência imensa, desde as descrições de torturas a assassinatos por razões que nos parecem totalmente absurdas, mas no meio deste horror, as pessoas encontram espaço e tempo para se amarem, para se ajudarem e até para escolherem manter viva a criança nascida na sequência de tortura e violações. O livro fala na felicidade mas penso que é sobretudo um livro sobre a esperança, esperança num futuro em que todas estas questões estejam ultrapassadas, daí a importância, centralidade e proteção dadas à Menina Jebeen a Segunda.
Não é uma leitura fácil, pela dimensão, pelo horror de muitas das histórias, pelo desconhecimento que temos daquela parte do mundo, e penso que o livro também evidencia o tempo que a autora o levou a escrever e a vontade de nele relatar histórias e personagens que tinha conhecido ao longo de vinte anos do seu ativismo, mas é, indiscutivelmente, um livro a não perder.
Acabei de o ler, mas penso que precisava de o ler de novo para o captar na sua totalidade.
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