Satânia, Judith Teixeira (Livro B - E-Primatur)

Independentemente desta nostalgia, própria da idade, há sempre boas descobertas. Uma delas foram os Livros B, da E-Primatur, editora que já conhecia e admiro, pelos projetos que desenvolve e pela qualidade das edições.
Trouxe comigo estes dois livros, ambos escritos por mulheres. Lembro-me de ter visto há muitos anos o filme Metrópolis, de Fritz Lang, de 1927, e de ter ficado deslumbrada pela visão e pelo modernismo do filme, um precursor dos filmes e romances de ficção científica modernos. Não soube então que a autora do romance e do guião era uma mulher, Thea Von Harbou. Segundo a contracapa, o romance foi publicado em 1926 e deu «origem a um guião ao mesmo tempo que Lang ia testando a aplicação estética da história que ia sendo construída.»
Quanto a Satânia, de Judith Teixeira, surpreendeu-me pelo título e também pelo que li na contracapa da obra:
“Todos os livros de Judith Teixeira foram livros malditos. Malditos por uma crítica que considerava «desavergonhadas» as temáticas lésbicas e sensuais presentes na sua escrita, apreendidos, queimados e nunca defendidos pelos seus pares masculinos”.
O seu livro Decadência, de poesia, foi apreendido, juntamente com os livros Canções e Sodoma Divinizada, respetivamente, de António Botto e Raul Leal, mas sobre o livro de Judith Teixeira nenhuma voz se fez ouvir. Satânia é o único livro de prosa que a autora escreveu. E é sobre o desejo feminino que fala:
«(…) E a natureza, minha querida, sem todos os requintes, sem todos os recortes com que nós a aperfeiçoamos, todo o exotismo com que a nossa sensibilidade lhe vetou a crueza da sua nudez, é um monstro sensual a espreguiçar-se sem beleza e sem fim, numa continuidade reles – sempre igual! Mas é de Deus tudo!… Deus fez o monstro e as lentes da nossa sensibilidade para o olharmos!»
«(…) E a natureza, minha querida, sem todos os requintes, sem todos os recortes com que nós a aperfeiçoamos, todo o exotismo com que a nossa sensibilidade lhe vetou a crueza da sua nudez, é um monstro sensual a espreguiçar-se sem beleza e sem fim, numa continuidade reles – sempre igual! Mas é de Deus tudo!… Deus fez o monstro e as lentes da nossa sensibilidade para o olharmos!»
A edição inclui duas novelas, Satânia e Insaciada e uma Conferência que ela proferiu sobre ela própria «Em que se explicam as minhas razões sobre a VIDA, sobre a ESTÉTICA, sobre a MORAL» e na qual refere:
«Ninguém me faz a vida! Sou eu que componho e distribuo aos meus nervos os motivos das suas vibrações. Procuro subir toda a escala do entendimento interrogando-me, vibrando, até que a minha inteligência me esclareça e a minha sensibilidade se estilize.»
Uma novela – uma temática – corajosa para a época. Gostei de ler Satânia sobretudo por sentir que participava na reparação de uma injustiça, que não tinha sido exclusiva dos censores, mas também dos autores masculinos seus contemporâneos.
Uma novela – uma temática – corajosa para a época. Gostei de ler Satânia sobretudo por sentir que participava na reparação de uma injustiça, que não tinha sido exclusiva dos censores, mas também dos autores masculinos seus contemporâneos.
***
Comentários
Enviar um comentário